Introdução Tal experiência foi pensada a partir de alguns levantamentos sobre o território da Unidade Avançada de Saúde do Gaspar Alto, onde a população vivencia isolamento territorial e social, com famílias que residem muitos anos naquela localidade e são predominantemente idosas. Nesse contexto, a partir de uma iniciativa da UAS, com o apoio do Núcleo Ampliado de Saúde da Família e Atenção Básica (NASF-AB), foi criado um grupo de saúde (o qual foi intitulado pelas participantes: Grupo de Saúde Coração Feliz). O grupo é composto por mulheres idosas, ocorre de forma semanal, há mais de dois anos, visava, inicialmente, a questão da convivência e trocas de experiências.
A partir desse grupo, compreendeu-se a questão do papel das mulheres no âmbito intrafamiliar nessa localidade e as consequências negativas advindas em relação à autonomia e protagonismo. Inclusive, com diversas situações de quadros depressivos e ansiosos. Com base nesse contexto, em uma reunião entre equipes NASF-AB e Unidade de Saúde, pensou-se no planejamento do grupo para o ano corrente, 2019, justamente visando um maior contato dessas mulheres consigo mesma, já que, de modo geral, ao longo da vida assumiram, prioritariamente, o papel de mãe e esposa.
Assim sendo, desde início do ano trabalha-se com o grupo na ótica do empoderamento, esquema corporal e autovalorização. Porém, entendeu-se a necessidade de um processo mais intensivo nessa abordagem por visualizar que as óticas trabalhadas aconteceram de forma transversal a outros temas de saúde, sem o devido processo avaliativo.
Objetivos Uma maior percepção subjetiva para que essas mulheres possam assumir outros e/ou novos papéis e sentirem prazer desempenhando essa nova posição subjetiva.
Público alvo Mulheres, donas de casa, casadas ou viúvas, aposentadas, idosas, mães, com características de cuidado com outrem.
Divulgação Não foi realizado divulgação, pois o intuito foi trabalhar com o público já existente no grupo de saúde da UAS. Porém, foi acordado com as usuárias e pactuado a realização dos encontros temáticos.
Número de participantes 12
Atividades Foram realizados cinco encontros “intensivos” com temáticas pré-estabelecidas, sendo semanais, nas terças-feiras, no período vespertino (do dia 02/07/19 a 30/07//19). Os encontros tinham duração de uma hora e meia a duas horas e eram realizados no salão da igreja, próximo a unidade de saúde. Iniciou-se no dia 02 de julho com uma avaliação de qualidade de vida recomendada pela Organização Mundial da Saúde, a WHOQOL-bref (WHOQOL Group, 1998), com 26 questões que consideram vários aspectos relacionados a diferentes dimensões da vida e da visão de si mesmo nas últimas duas semanas. O primeiro encontro teve a temática “Tenda do Conto” (Gadelha, 2007), uma experiência exitosa da Política Nacional de Humanização. A prática busca abrir diálogo por meio da simulação de uma sala de estar à moda antiga e uma mesa sob a qual se colocam objetos trazidos pelas mulheres e que carregam consigo algum significado, ficando os participantes livres para expor seus relatos e sentimentos. Assim, os sujeitos participantes se colocam nas suas histórias e têm a possibilidade de revisitar memórias, vivências e sentimentos em um espaço seguro, sem julgamentos e na ótica do compartilhamento de saber que ensina e abre para novas possibilidades.
Já no segundo encontro foi construído um “Mapa Emocional do Território”, iniciou-se mobilizando as participantes do grupo para a produção coletiva de um mapa local em larga escala, onde elas pudessem colocar os “locais” que quisessem, contendo memórias, sentimentos, perdas, processo histórico e cultural, lembranças de infância, vivências e heranças. Dando sequencia, discutiu-se sobre o mapa, os pontos e sentimentos contidos nele (fotos do mapa constam em anexo). As usuárias tiveram um momento de fala livre e trouxeram memórias de sua infância, vida adulta e atual, conversaram sobre momentos do grupo, individuais e do território. Por fim, pediu-se que, de forma individual, colocasse um sentimento ou memória em relação ao território como um todo no mapa.
No terceiro encontro programou-se a realização de dois desenhos feitos individualmente por elas, o primeiro “como eu me vejo” e o segundo “como eu acho que os outros me veem”. Deixou-se livre para a utilização de folhas A4, caneta hidrocor, lápis de cor, entre outros materiais para a elaboração dos dois desenhos. Além disso, as usuárias puderam colocar em forma de palavras outras características que as mesmas julgassem interessantes para compor a produção do desenho. Subsequentemente, fez-se uma reflexão sobre os desenhos, em que todas tiveram o desejo de apresentar ao grupo o que foi desenvolvido individualmente. Por fim, entre o segundo e o terceiro encontro as usuárias solicitaram acrescentassem novos pontos no mapa, os quais se recordaram durante a semana, pois sinalizaram a importância de manterem viva a história local.
Por sua vez, no quarto encontro, a atividade proposta foi a de criação de um espaço para fala sobre os ciclos de repetições. Com a utilização de dois bambolês, na representação de um ciclo, foi entregue para as participantes do grupo bilhetes em branco para que elas escrevessem e colassem no bambolê palavras ou frases que elas entendiam ter caráter de repetição nos ciclos de suas famílias. Ao final, fez-se a leitura dos bilhetes e refletiu-se o por quê dos bambolês, a representação deles para elas, sobre os ciclos de repetição nas famílias e quais conseguiram ser quebrados.
No último encontro com a temática já pré-estabelecida, comemorou-se com uma festa Julina, com músicas, quadrilha, brincadeiras e lanche típicos e, por fim, reaplicou-se a WHOQOL-bref, novamente, para comparativo.
Resultados Com os processo realizado pode-se observar através do WHOQOL-bref a questão da qualidade de vida das idosas, em uma média simples das questões e com comparativo pré e pós-atividade as usuárias apresentaram aumento da qualidade de vida, conforme avaliação pelo referido instrumento.
A tabela 1 traz os dados obtidos através dos questionários:
PARTICIPANTE P1 P2 P3 P4 P5 P6 P7 P8 P9 P10 P11 P12 MÉDIA
PRÉ 4,15 4,19 3,27 3,96 3,62 3,73 4,08 3,85 3,54 4,27 // // 3,87
PÓS 3,92 4,23 3,08 4,28 3,96 4,15 4,38 3,71 3,85 3,96 3,46 3,88 3,91
Apesar de ser um período curto de ação direta e o instrumento se basear nas duas últimas semanas, pode-se perceber que em atividades no período de cinco semanas houve um aumento da qualidade de vida referida pelas usuárias. Além dos dados obtidos observou-se também em relação ao Domínio Meio Ambiente, em especial em relação às facetas 8 (segurança física e proteção), o qual a média das respostas foi de 3,9 para 4,2; e 9 (ambiente no lar) que foi de 3,8 pré encontros temáticos para 3,9 pós encontros. Também pode-se citar a mudança de atitude das usuárias dentro do grupo com o decorrer dos encontros, estando mais participativas, expressando desejos e opiniões.